Diana/20 anos: Como as redes sociais estão a matar os paparazzi

A saga repete-se. Quando em maio deste ano, William, 35 anos, o filho mais velho de Diana, pediu uma indemnização de 1,5 milhões de euros a duas revistas pela publicação de fotografias de Kate em topless, estava apenas a cumprir mais uma etapa de uma cruzada: lutar contra a devassa da sua vida privada e honrar o nome da mãe.

Uma vida debaixo dos holofotes. Foram quase duas décadas captadas à exaustão. Desde os 19 anos, quando o Palácio de Buckingham anunciou o noivado com o Príncipe Carlos, a 24 de fevereiro de 1981, Diana Frances Spencer percebeu o que viria a seguir. Para onde se virava, lá estava um fotógrafo. Era o início de um longo calvário, que terminaria na noite de 31 de agosto de 1997, quando o Mercedes S280 em que seguia, na companhia do namorado Dodi Al-Fayed, embateu no 13º pilar do túnel da Ponte da Alma, em Paris.

Até aí, triste ironia, Diana e Dodi, acabados de jantar, fugiam de sete paparazzi que procuravam captar o momento de romance da “Princesa do Povo” com o herdeiro da cadeia de armazéns Harrods.

Henri Paul, o motorista que conduzia o carro de alta cilindrada, e o milionário egípcio tiveram morte imediata. Diana, que tal como o companheiro viajava sem cinto de segurança, sofreu hemorragias internas graves, mas ainda foi transportada para o Hospital Pitié-Salpêtrière. O óbito seria declarado às quatro da madrugada.

A história é difícil de esquecer. “Penso que uma das coisas mais difíceis de aceitar é o facto de as pessoas que estavam a persegui-la no túnel serem as mesmas pessoas que estavam a tirar-lhe fotos enquanto ainda estava a morrer no banco traseiro da viatura”. A frase é de Harry, 32 anos, o filho mais novo de Diana, num documentário exibido pela BBC para assinalar os 20 anos da morte da princesa.

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“Ela tinha um ferimento grave na cabeça, mas ainda estava viva no banco traseiro. E essas pessoas que causaram o acidente, em vez de ajudarem, estavam a tirar-lhe fotos enquanto estava a morrer. E depois essas fotografias chegaram aos media deste país”.

As imagens, aquelas imagens infinitamente repetidas, ecoam na cabeça dos filhos. Naturalmente. Já aquando do nascimento dos filhos de Kate e William, os duques de Cambridge denunciaram aquilo a que chamaram de “técnicas perigosas” dos paparazzi para conseguirem o lucro fácil de imagens não autorizadas dos príncipes George e Charlotte.

Os últimos anos

Se o interesse de Diana de Gales por parte da imprensa começou cedo, logo no anúncio do noivado e, mais tarde, a partir do casamento, a 29 de julho de 1981, ele foi crescendo na inversa proporção da felicidade matrimonial.

Os ecos da instabilidade no casamento foram aumentando, os rumores de relações extra-conjugais também e a entrevista explosiva concedida em 1995, em que assume as suas infidelidades, acabou por ser decisiva na busca voraz pela imagem que valesse uma história.

“Ela sofreu muito nas mãos dos paparazzi, sobretudo nos últimos dois anos de vida”, contou à Sky News o escritor e fotógrafo real Ian Lloyd, acrescentando que “houve um interesse constante na imprensa, mas nos últimos dois anos da sua vida a coisa descontrolou-se por completo”.

Felipa Garnel, jornalista, que nos últimos 20 anos dirigiu as revistas “Caras” e “Lux”, concorda com a teoria de que os últimos dois anos de vida de Diana foram os mais difíceis, mas Lady Di “foi, ao mesmo tempo, um sopro de frescura e um teste para a coroa e para a imprensa”.

“Diana foi desde sempre muito popular, porque, apesar de não ser plebeia, era vista como uma de nós: descontraída, divertida, tinha um lado humano que contracenava com o lado conservador da realeza britânica e do próprio Carlos”, afirma à N-TV. E acrescenta: “Por outro lado, o surgimento de Diana foi um teste: por um lado, a monarquia não estava habituada a ter alguém tão empático para os jornalistas. Por outro, os jornalistas não estavam habituados a ter alguém tão popular, tão querido pelo povo”.

“Mesmo depois da tragédia, ela continuou a vender, o que prova bem a sua popularidade. Tornou-se num mito”

A jornalista, que acompanhou pela SIC, ao lado de Alberta Marques Fernandes, as cerimónias fúnebres da princesa, recorda que “Diana vendia imenso”. “Sempre que eu fazia uma capa na ‘Caras’ com ela, as vendas subiam 15, 20, 25 mil exemplares”. Eram outros tempos também nas vendas em banca no mercado editorial português. “Nesses tempos da ‘Caras’ chegámos a vender 200 mil exemplares”, sublinha, lembrando o papel de Diana, que parecia sempre “uma boneca no meio das bruxas”.

“Mesmo depois da tragédia, ela continuou a vender, o que prova bem a sua popularidade. Tornou-se num mito”, afirma a jornalista portuguesa.

Vinte anos depois da morte de Diana, os paparazzi não acabaram, mas no que toca à relação com a realeza britânica estão mais brandos. Quem o defende é Terry Kirby, profissional de jornalismo durante 20 anos antes de se tornar professor e diretor da escola de jornalismo da Goldsmiths University, para quem os “constantes avisos da coroa britânica têm servido para alguma coisa”.

“Há uma espécie de consciência jornalística coletiva. Quem faz hoje esse trabalho não são os mesmos profissionais de há 20 anos, mas toda a gente se lembra do que aconteceu com Diana. Há um antes e depois”, afiança o estudioso.

E se fosse connosco?

“Em Portugal, a realidade é bem diferente. Sempre foi. O mercado é infinitamente mais pequeno, as nossas celebridades são à nossa dimensão e nunca se cometeram as loucuras do Reino Unido ou de Espanha”, explica à N-TV um fotojornalista que, “não sendo paparazzo”, já trabalhou para revistas que “publicavam paparazzi”.

O profissional recorda que “há seis, sete anos”, apesar de tudo, “apostava-se mais em paparazzi”, mas “a crise e a chegada das redes sociais reduziu muito a necessidade de recorrer a este tipo de expediente”.

“Ao publicarem as suas fotos constantemente nas redes sociais, as celebridades não só controlam os danos da sua imagem, porque colocam os seus melhores ângulos, como acabam com o mercado de paparazzi”, acrescenta o mesmo profissional.

“Estamos a falar de tempos em que, por exemplo, um conjunto de imagens do [Cristiano] Ronaldo e da Nereida [Gallardo] poderia valer alguns milhares de euros”

Um outro fotógrafo, que “há oito ou dez anos” conseguia fazer por mês “quatro a cinco mil euros” só com imagens não autorizadas, reconhece que hoje “isso já não é possível”. “Estamos a falar de tempos em que, por exemplo, um conjunto de imagens do [Cristiano] Ronaldo e da Nereida [Gallardo] poderia valer alguns milhares de euros”, recorda, para em seguir constatar com um sorriso: “Hoje é o próprio Ronaldo, ou quem gere as redes sociais por ele, a colocar fotos dele com a namorada [Georgina Rodríguez] e com os filhos. O mundo mudou mesmo.”

Felipa Garnel lembra-se, já como diretora da “Lux”, de ter orçamento elevado para a compra de paparazzi. “Era fácil fotografias internacionais custarem valores astronómicos. Olhe, estou a lembrar-me, por exemplo, das fotos da primeira filha biológica da Angelina Jolie [Shiloh Nouve, 2006]”, recorda. E acrescenta que bastava pressentir que “determinada foto poderia valer um aumento de vendas em banca” para “não hesitar na sua compra”.

As redes sociais, considera a jornalista, vieram acelerar “a morte dos paparazzi e, em certa medida, do papel, pelo menos neste segmento”. “É impossível concorrer com os blogues e os Instagram das celebridades. Ninguém espera quatro ou cinco dias por uma revista em papel para ver uma foto que, uma hora depois de ter sido publicada na rede social, já está num site”, conclui.

TEXTO: Nuno Azinheira

 

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