Exclusivo N-TV. José de Pina: “Convivência com Pedro Guerra ficou impossível com o que aconteceu”

O guionista José de Pina confirmou esta quinta-feira a sua saída do painel de comentadores do programa da TVI “Prolongamento”. O adepto do Sporting afirma que “o lamentável incidente de segunda-feira” foi o fim da linha. Em entrevista exclusiva esta tarde à N-TV, Pina diz que “a política entrou no futebol” e que Bruno de Carvalho “infelizmente” não tem condições para continuar.

ENTREVISTA: Nuno Azinheira

Por que razão decidiu sair do “Prolongamento”?
Porque já não fazia sentido continuar. Aquilo para mim era mais um programa de televisão em que tentei fazer a minha ironia, usar de algum sarcasmo. Só que chegou a uma altura em que já não era possível, nunca conseguia falar. Já não aguentava mais. E não foi de agora.

Desde quanto?
Há muitos meses.

E porque é que só agora decidiu sair?
Porque sou um profissional da comunicação, porque gosto de cumprir compromissos e porque a TVI sempre foi impecável comigo. Mas este anúncio pode ser a crónica de uma saída anunciada, porque já há muito tempo que eu estava a pensar nisso. Se não fosse argumentista e um profissional, já teria saído antes.

O episódio de segunda-feira, com Pedro Guerra a levantar-se e a ameaçá-lo, depois de o José de Pina lhe ter chamado “animal” e “nojo de pessoa”, foi a gota de água?
Foi a gota de água, sim. Foi um lamentável incidente, um ultrapassar de várias linhas.

A convivência com Pedro Guerra ficou impossível depois do que aconteceu?
Sim, acho que sim. Depois do que aconteceu, acho que sim. Mas isto foi apenas a gota de água. Quem vê o programa sabe bem que havia um histórico no programa. Eu fui levando as coisas, mas há sítios para onde fui levado e para onde não quero ir.

“Talvez tenha ultrapassado uma linha mais humorística, mais extrema, com algum humor negro… talvez. mas Nunca inventei, nunca menti, nunca insinuei a existência de malas
nos balneários”

Que sítios são esses?
Como escrevo na minha mensagem no Facebook, estava a ser puxado para um buraco negro com cada vez mais força. Por isso, resolvi fazer como o James Kirk da nave Enterprise da serie “Star Trek”, accionei a velocidade Warp 7 [risos].

A culpa é só de Pedro Guerra? Não sente que em algum momento possa ter ultrapassado essas linhas?
Talvez, num momento ou outro [pausa]. Talvez tenha ultrapassado uma linha mais humorística, mais extrema, com algum humor negro… talvez. Mas nunca inventei, nunca menti, nunca insinuei a existência de malas nos balneários.

Como fica a sua relação com Pedro Guerra?
Não quero ir por aí.

Mas se o encontrar na rua, muda de passeio, cumprimenta-o ou finge que não o vê?
A sério, não faz sentido responder-lhe a essa questão. A minha relação com esse senhor era profissional. Era uma relação que cessa neste momento.

Para muitos espectadores fica a ideia que em determinado momento, desde a época passada, o programa ficou mais pesado. Faço-lhe uma pergunta muito direta: em algum momento a TVI pediu-vos para serem mais agressivos por causa das audiências? Alguma vez vos deu a entender que quanto pior, melhor?
Não, não, não. A TVI nunca nos pediu para forçar a nota. Tenho de sublinhar isso. A TVI sempre me apoiou. Quando fui convidado, senti que ia divertir-me. O programa seguiu no início um caminho de entretenimento que se diferenciava dos outros. Era mais engraçado. Mas a partir de certa altura houve atitudes que o desvirtuaram.

“Eu estava ali como adepto simples, normal. Nos últimos anos, os programas ficaram cheios de pessoas que são autênticas máquinas de propaganda, quase robotizadas”

Que atitudes?
Repare, Nuno: eu estava ali como adepto simples, normal. Nos últimos anos, os programas ficaram cheios de pessoas que são autênticas máquinas de propaganda, quase robotizadas. É legítimo, não estou a dizer que não é legítimo, mas ao fim de um tempo isso cria um choque inevitável.

Porquê?
Eu não sou uma máquina de propaganda. Não sou, nem quero ser. Sou um adepto do Sporting e sou um profissional desta área. Mas penso pela minha cabeça.

Pedro Guerra não pensa pela sua cabeça?
Não quero saber disso para nada, o que sei é que a comunicação política entrou no futebol e estragou este tipo de programas. É legítimo, repito. Mas não é o meu registo.

Acha que chegou o fim da linha para este tipo de programas, com adeptos dos três grandes?
Não, não acho. Continua a haver margem para este tipo de programas, mas a politização do futebol não é bom. O tipo de comunicação mudou. É normal e legítimo, insisto. Mas este é um facto. Nos últimos anos houve determinado profissionais de comunicação que foram para o futebol.

E isso é mau?
É o que é. Eu percebo que para os clubes isso pode ser importante, mas isso estendeu-se a este tipo de programas. O espírito destes programas era replicar as conversas de café, as histórias dos lagartos, dos lampiões e dos tripeiros. Era a discussão típica dos adeptos de bancada. Isso deixou de ser possível.

A época que agora chega ao fim terá sido a mais quente de sempre no futebol português, com acusações, comentários, um ambiente de permanente crispação, como nunca se tinha visto. Não reconhece que o grau de agressividade de programas como o “Prolongamento” contribuiu para este clima perigoso que se vive fora dos relvados?
Não, nada disso. Estes programas são o fim da cadeia. Ao longo da cadeia, os responsáveis vão limpando as mãos com aqueles que vêm a seguir na linha de sucessão.

Quem está no topo da pirâmide? Os dirigentes?
Claro que sim. Os dirigentes estão no topo dessa cadeia. Mas também alguns jornais. É evidente que estes programas podem ajudar um bocadinho a crispar os ânimos, mas são seguramente os menos culpados.

“Estou a viver com preocupação, tristeza, angústia. Não quero acreditar em muitas coisas que se estão a passar. Eu como sportinguista não vou fingir que não se passa nada”

O que é certo é nunca o ambiente este tão quente como agora. Terça-feira assistimos ao impensável, com a invasão da academia de Alcochete. Como é que está a viver este momento negro da história do seu clube?
Estou a viver com preocupação, tristeza, angústia. Não quero acreditar em muitas coisas que se estão a passar. Eu como sportinguista não vou fingir que não se passa nada.

Esta conversa decorre na tarde do dia em que a Mesa da Assembleia Geral e o Conselho Fiscal se demitiram em bloco e no momento em que o Conselho Diretivo está reunido de urgência. É o fim de Bruno de Carvalho?
Não sei se é o fim. Ele apareceu como algo de muito positivo no Sporting. Fez coisas espetaculares no clube. Ainda pode ficar na história do clube.

Como? Demitindo-se?
Todas as pessoas têm direito a ter os seus momentos infelizes. O Bruno de Carvalho foi a pessoa que foi ao encontro das ideias que eu sempre defendi para o Sporting. Não fui eu que o descobri, mas ele apareceu. As minhas ideias continuam iguais. Se alguém mudou não fui eu.

Arrepende-se de o ter apoiado?
Não, por aquilo que já disse, não me arrependo.

Mas Bruno de Carvalho tem condições para se manter na presidência do Sporting?
Não, não tem condições. infelizmente, não tem.

 

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