“O Segredo dos Deuses”. TVI perde recurso e é obrigada a ocultar identidade de menor adotado pela IURD

A TVI perdeu o recurso que apresentou no Tribunal da Relação, continuando obrigada a ocultar nos seus conteúdos a identidade de um jovem adotado por um bispo da Igreja Universal do Reino de Deus visado nas reportagens “O Segredo dos Deuses”.

A TVI não se conformou com a decisão do tribunal de primeira instância que obrigava a televisão a retirar de todos os conteúdos o nome de um dos menores visados em algumas das reportagens sobre adoções alegadamente ilegais por parte da IURD, mas o Tribunal da Relação de Lisboa (TRL) não lhe deu razão.

Numa decisão a que a agência Lusa teve acesso, os juízes desembargadores consideram que “nenhum interesse público justificava a exposição pública da identidade e nome dos nela visados” ao contrário do que estação de televisão alegou.

A decisão do tribunal cível, da qual a TVI recorreu para o TRL, determinou que fossem removidos ou ocultados dos episódios 7 a 9 das reportagens a imagem de P. e o seu nome verdadeiro.

A estação de televisão não se conformou com a decisão e invocou o interesse público das notícias e a inexistência de imputações pejorativas das notícias aos menores visados nos conteúdos e que o menor [à data dos factos] que pede para não ser identificado “não foi referido nas primeiras reportagens”, pelo que “não tem o direito de pedir para remover o conjunto das 10 reportagens”.

Opinião diferente tiveram os juízes Cristina Neves, Manuel Rodrigues e Ana Paula Carvalho, referindo que “o direito a informar não é um cheque em branco e tem de ser exercido com responsabilidade e com respeito pela dignidade da pessoa humana”.

Para o tribunal superior o facto de tais conteúdos estarem disponíveis no ‘site’ da TVI lesa os direitos de P., “consuma-se a cada visualização e prolonga-se enquanto a sua imagem e nome estiver disponível com ligação a estes factos”.

Os juízes escrevem que a TVI teve o cuidado “de forma inexplicável e com evidente dualidade de critérios” de omitir a imagem e identidade da alegada mãe natural, “mas não tiveram idêntico cuidado de omitir a verdadeira identidade e imagem dos menores visados (alegadamente as verdadeiras vítimas deste suposto esquema de adoções ilegais e as suas famílias)”.

“E nada, mas absolutamente nada justificava tal atitude” lê-se na decisão, acrescentando que “não só viola uma disposição legal que visou tornar secreto o processo de adoção, incluindo a identidade do adotante, como viola de forma inadmissível o direito dos nele visados, o então menor (agora recorrente) da reserva da sua vida íntima, relatando factos sobre a sua mãe biológica e a sua infância que são objetivamente traumáticos”.

O tribunal chega a questionar “qual o interesse público nesta divulgação de identidade e imagens das supostas vítimas, ocultando, por sua vez o nome, voz e imagem da suposta mãe biológica”.

A TVI exibiu em dezembro de 2017 uma série de reportagens denominadas “O Segredo dos Deuses”, na qual noticiou que a IURD esteve alegadamente relacionada com o rapto e tráfico de crianças nascidas em Portugal.

Os supostos crimes terão acontecido na década de 1990, com crianças levadas de um lar em Lisboa, que teria alimentado um esquema de adoções ilegais em benefício de famílias ligadas à IURD que moravam no Brasil e nos Estados Unidos.

TEXTO: Lusa